Moedas do Leprosário: As moedas da Exclusão no Brasil

Moedas do Leprosário: As moedas da Exclusão no Brasil

Durante o século XX, instituições brasileiras destinadas ao isolamento de pacientes com hanseníase criaram moedas próprias, usadas exclusivamente dentro dos leprosários. O objetivo declarado era impedir o contágio da doença por meio do dinheiro comum, mas, na prática, essas moedas funcionavam como instrumentos de vigilância, controle e exclusão econômica.

Entre os casos conhecidos, dois se destacam pela existência de moedas físicas preservadas: a Colônia Santa Teresa, em Santa Catarina, e o Hospício dos Lázaros, vinculado à Santa Casa de Misericórdia, no Rio de Janeiro. Hoje extremamente raras, essas peças tornaram-se objetos de valor histórico e numismático.



  AS MOEDAS DO LEPROSÁRIO COLÔNIA SANTA TEREZA  



Colônia Santa Teresa: Moeda em nome da saúde

Fundada em 11 de março de 1940, no município de São José (hoje São Pedro de Alcântara), a Colônia Santa Teresa foi planejada como uma comunidade autossuficiente, com hospital, cartório, igreja, escola, oficinas, cemitério e até cinema. Como o uso de dinheiro convencional era proibido por razões sanitárias, adotou-se um sistema monetário interno exclusivo.

As moedas da colônia foram cunhadas em latão pela Siderúrgica Eberle, de Caxias do Sul (RS), e circulavam em valores de 100, 200, 300, 500 e 1.000 réis. O anverso trazia a indicação do valor precedida da sigla “Nº”. O reverso exibia as iniciais “C.S.T.”, correspondentes a Colônia Santa Teresa. Um detalhe notável é a disposição dos pontos da sigla, levemente inclinados, com o último ponto fora de alinhamento — uma característica que auxilia na identificação de peças autênticas.

A moeda de 300 réis é considerada a mais rara da série, possivelmente devido à sua ampla circulação no pagamento de entradas para o cinema da colônia. Segundo dados do catálogo Numista, essas peças possuem índice de raridade elevado, o que reforça seu valor numismático.

Mais do que simples fichas de troca, as moedas de Santa Teresa ilustram o esforço institucional de criar uma economia paralela, fechada e controlada. Elas simbolizam um sistema que, em nome da saúde pública, segregava economicamente os pacientes e reforçava as fronteiras entre os “sãos” e os “isolados”.


Hospício dos Lázaros: Um modelo pioneiro

No Rio de Janeiro, o Hospício dos Lázaros foi uma das primeiras instituições brasileiras a emitir moeda interna. Ligado à Santa Casa de Misericórdia, o leprosário começou a operar com esse sistema provavelmente no século XIX. A moeda conhecida tem valor de 1.000 réis, é feita em latão e traz a inscrição “Hospício dos Lázaros” no verso.

Apesar de pouco documentadas, essas moedas são extremamente raras e altamente valorizadas no mercado de colecionismo. Seu surgimento está diretamente ligado ao modelo de leprosário que vigorava à época: instituições totais, fechadas, nas quais os internos não tinham qualquer contato com o mundo exterior — inclusive no campo monetário.

As moedas não eram apenas uma solução sanitária baseada em temor infundado de contágio. Elas reforçavam a lógica da autossuficiência compulsória, impedindo que pacientes saíssem da colônia, já que sua moeda não tinha valor fora dos muros do leprosário. Como não podiam portar dinheiro comum, tampouco podiam viajar, comprar passagens ou fugir.


Numismática, exclusão e memória

Ambas as emissões, de Santa Teresa e do Hospício dos Lázaros, revelam uma interseção entre numismática e políticas públicas de saúde marcadas pelo medo, pelo desconhecimento e pela segregação. Criadas como ferramentas de contenção, essas moedas passaram a carregar, com o tempo, um valor simbólico que transcende seu uso original.

O reconhecimento dessas peças pelo catálogo de Krause inseriu-as oficialmente no universo da numismática internacional. Esse status elevou seu valor no mercado, mas também gerou um efeito colateral: a proliferação de réplicas, especialmente das moedas mais antigas, o que exige atenção redobrada dos colecionadores quanto à autenticidade.

Apesar disso, o interesse por essas moedas se mantém firme, movido não apenas pela raridade, mas pela história que elas representam. São objetos que materializam a exclusão de milhares de brasileiros internados compulsoriamente, afastados da vida social e econômica do País por décadas.


Por que colecionar essas moedas importa

A preservação dessas moedas, seu estudo e colecionamento não são apenas um exercício de curiosidade histórica. Elas servem como lembretes tangíveis de um período sombrio em que o preconceito foi institucionalizado, e o dinheiro, um símbolo do isolamento.

Estudar essas peças é uma forma de resgatar a memória dos que viveram sob o peso do estigma e do abandono. É também uma oportunidade de refletir sobre como instrumentos cotidianos — como o dinheiro — podem ser usados para excluir, marginalizar e silenciar.

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  • user por Jonathan

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  • user por Eu tenho uma sou governador Valadares

    Aceito proposta e tenho mais moedas.

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  • user por Filipe Leite Alexandre

    Tenho dessas moedas pra vender como faço (33)991043282

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